À morte não é um espaço preciso, a resumir-se em data e hora especificas onde os documentos resumem “start and off”. Quando na sala de cirurgia o médico diz: “Acabou. Não se pode fazer mais nada”, depois disso a vida se remexe inteira noutro plano, a reivindicar novos espaços de saber.
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A primeira lembrança marcante que tenho do Matheus já era um convite à novos saberes. Ele estagiava no jornal e eu, como tutora, era responsável por ajudá-lo a produzir reportagens atendendo a critérios de imparcialidade, impessoalidade, clareza e outras coisinhas ética das quais não abríamos mão.
Lembro-me do dia em que Matheus foi escalado para fazer uma reportagem sobre um acidente em andamento. Na entrada de Santa Isabel um motorista encontrava-se preso às ferragens.
No local dos fatos, o jornal chegou antes da equipa de socorro, e Matheus recebeu a instrução: converse com o motorista até à ambulância chegar. Ele ficou na cabine, com o corpo abaixado a conversar com o homem ferido que chorava muito e lembrava da família.
Matheus foi sua última companhia. Quando o corpo desistiu era ele quem estava lá, quem ouviu o último pensamento, quem partilhou com o motorista o último suspiro em súplica de ar.
Naquela tarde ele desistiu de ser jornalista. Chorou com tanta verdade, que ali eu aprendi que só os homens corajosos choram sem medo. Só os corajosos demonstram sentimentos e são capazes de tamanha compaixão.
Eu estava lá, na tarde em que Matheus recebeu a carteirinha da OAB, uma solenidade simples, numa sala cheia de cadeiras vazias. Ele dedicou a conquista para a mãe, Cássia Barbosa, lembrou o menino que foi e os desafios que se interpuseram em cada etapa da sua vida.
E não foram poucos, Matheus era todo riso e brincadeira, e até isso foi uma conquista. Nenhuma conquista veio sem uma dedicação obstinada e digo isso porque falar de suas conquistas sem dizer que para cada uma houve um esforço e uma festa, folga, ou qualquer outra distração perdida.
Seu sucesso não foi resultado de sorte, não insulte sua memória com isso. Matheus trabalhava imenso, horas e horas a fio, acima de tudo porque ele realmente acreditava na justiça.
“Mas ele é só um menino”, foi exatamente o que pensei quando recebi a notícia. E havia muita vida… tanta vida para seu destino.
Será que me despedi dizendo o quanto o admirava? Será que em cada despedida disse o quanto ele era um ser humano que sempre me ensinava a ser melhor?
Por que deixamos para depois o que nos é mais elevado?
No auge de minha tristeza pensei na família e no amor de Matheus pela Camila.
Pensei na volta para casa e ver o último copo de água largado na mesa que ele jurou que não ia esquecer de lavar, mas, por sorte esqueceu. Estavam todos lá. O copo, o sofá, a cama… tudo vazio. Preenchido de memórias que testemunham que o amor é algo possível.
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Esse é meu convite para que você que lê este texto, pense no que aprendeu com cada pessoa que passou na sua vida.
Diga que ama, mais vezes; tenha coragem de chorar; tenha coragem de se dedicar ao que acredita; tenha coragem de amar.
Todo resto é pueril e o tempo, bem, o tempo passa diferente